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Misticismo

 Fé e tradição ainda são raízes presentes nas casas de muitos nordestinos 

No sertão, famílias preservam tradições religiosas e costumes. Os ensinamentos são repassados aos mais moços.

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Cidade de Miraíma, já era noite e chovia bastante. José Maria e Rosário Batista afloram a fé com manifestações da religiosidade popular. Enquanto a chuva renova a paisagem do interior, os sertanejos realizam a renovação do sagrado coração de Jesus. Eles fazem isso há mais de 40 anos, inicialmente no Cariri, hoje em Miraíma. 

 

O casal soube guardar a fé de maneira que o tempo não a desgastou, sendo ela muitas vezes o seu único refúgio naquele lugar. Nas paredes é possível ver os quadros do Sagrado Coração de Jesus, da santa-ceia e do “Padim Ciço", como diz a dona Rosário. Os idosos possuem um terço no pescoço de cor vermelha, do qual se presentearam ainda na adolescência e no armário de vidro diversos santos de gesso.

 

Depois da "janta", eles se reúnem na sala, é o momento de cobrir todos os santos e quadros que estão na casa. De acordo com eles, aquele ato remete ao Mistério Pascal, que é o mistério da morte e ressurreição de Cristo, do sofrimento e da alegria, da perda e da vitória. Após isso, eles rezam o terço duas vezes e cantam os mesmos louvores todos os anos. 

 

“Não é nenhum sofrimento, já virou tradição. É uma coisa da nossa família. Um ato religioso que prova o compromisso da gente de viver o evangelho e seguir ao nosso Deus”, explica Rosário Batista, 79 anos. “Desde pequeno meus pais me ensinaram a fazer essas coisas, quando casei com ela começamos a fazer juntos, é tão bom. Antes fazíamos com os nossos filhos, mas agora só com os netos quando eles vêm pra cá. Já estamos ensinando pra eles também. É bom se apegar na fé”, conta o seu José, 81 anos.

 

O Ceará é de muitas crenças. E assim como com o casal, o misticismo faz parte de muitas outras famílias no interior do Ceará. Um exemplo claro da religiosidade existente nos sertões é o monumento ao Padre Cícero, em Juazeiro do Norte e o de São Francisco, que tem em Canindé o segundo maior movimento de romarias em sua homenagem. 

 

“Se fosse uma língua, as Crenças Populares seriam um "portunhol", nem português nem espanhol, mas uma tentativa de conviver na fronteira de universos em trânsito. E em âmbito nordestino esse valor não só demarca uma territorialidade forte nas comunidades sertanejas e litorâneas, mas também são exportáveis pela grande diáspora nordestina no Brasil”, explica Christian Dennys Monteiro, Professor do Departamento de Geografia da UFC e Coordenador do Laboratório de Estudos Geoeducacionais e Espaços Simbólicos.


Em uma pesquisa realizada em 2018, pelo Instituto Opnus, foi percebido que a religião predominante no interior do Ceará ainda é o catolicismo. Além disso, foi observado que a religião evangélica, tem encontrado brechas e feito cada vez mais fiéis, porém o aumento se dá, nos centros urbanos e nos mais jovens.

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O resultado da pesquisa não é por acaso, muitos dos responsáveis pelo misticismo no Nordeste, possuíam uma conexão com o beatismo (fenômeno ligado ao catolicismo popular). Não podemos falar em misticismo sem citar Padre Ibiapina, Antonio Conselheiro, beato José Lourenço e padre Cícero, todos cearenses, exceto José Lourenço, nascido em Alagoas. Eles foram responsáveis em mudar a realidade de muitos nordestinos, reverberando os seus ensinamentos até os dias de hoje. Os beatos eram empreendedores. Ajudavam a comunidade, reformavam igrejas, construíram orfanatos, escolas, abrigos e davam conselhos. Ao mesmo tempo em que ganhavam a confiança e pregavam suas crenças.


Para Christian Dennys, a experiência mística possui sim um papel fundamental na construção da identidade regional, porém, sempre atribuída a outros saberes. “Sua característica é a comunicação direta de uma divindade imanente ao místico, que pode transcender dele aos outros em suas mensagens. Não vejo que isto seja tão diferente em outras regiões do Brasil. O que existe é uma reafirmação - em parte buscando demarcar identidades e também preconceitos - de uma força nordestina diferenciada ou mais brasileira. A experiência mística está em toda parte e em todos os tempos. Algumas vezes ganha visibilidade. Porém, só por ela, não há responsabilidade de construção de identidade regional”, conclui.

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Um passeio intimista à estátua do Padre Cícero em Juazeiro do Norte-CE. Uma caminhada carregada por fé e esperança de muitos romeiros que passam por devoção e a pedidos. Um olhar sobre a simplicidade da fé e de como um coletivo se desenvolve por meio da religiosidade. Em Caminhos de Fé, a religiosidade e as marcas da memória fazem parte do conjunto temático das fotografias, olhares de muitas pessoas que já passaram pelos mesmos caminhos e que diariamente, olhos curiosos e devotos chegam até a estátua de Padre Cícero.

Livreto

Procurando por estórias para passar a noite?  

Uma coletânea de contos para você ler antes de dormir, ou não. No livreto, Visagens: contos para não dormir, vamos contar alguns mitos e lendas do interior do Ceará. Estórias de medo, mistério e dúvidas. Narrativas passadas de geração em geração por nossos avós

Escute o nosso terceiro episódio, Contando pesadelos, do nosso podcast Bons de Lábia. Vamos conversar sobre mitos e lendas da nossa terrinha. Estórias de medo e dúvidas.

EP 03
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