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 Descanso entre as raízes do antigo baobá 

Uma homenagem ao Gilmar de Carvalho e as suas contribuições à comunicação e à cultura popular nordestina.

Na sombra das árvores do centro da capital cearense, Gilmar de Carvalho descansa. Um dos maiores símbolos de pesquisa sobre a cultura popular e uma personalidade que moveu e move os saberes cearenses. Sempre crítico e com opiniões que mexiam com quem ouvisse seus discursos, uma pessoa simples, gostava de andar bem vestido, era pragmático e com muita bagagem para conversas. 

 

Uma mistura de estar presente e saber a hora exata de sair de cena. “Foi um dos grandes incentivadores para que eu me tornasse professor hoje”, comentou Ricardo Jorge, professor do curso de jornalismo da UFC. No convívio com os colegas de trabalho ele era bastante particular, às vezes introspectivo, mas sociável, um reflexo da personalidade, “poderia ser um cidadão do mundo, como poderia ser uma pessoa tipicamente cearense, alencarina, essa coisa do universal e do regional”, descreve Ricardo.

 

Inspiração e admiração fazem parte de quem conheceu a figura cativante de Gilmar de Carvalho durante sua vida. “Uma grande pessoa que conheci desde criança”, comenta o poeta Daniel Assaré. Desde o começo a admiração pela pessoa que Gilmar foi sendo construída para o poeta, se apresentou para o professor e obteve muitos elogios de Gilmar. “Eu fiquei encantado com os elogios no final da apresentação, foi grandioso e animador”, relata Daniel.

 

Sempre foi referência para muitas pessoas, Gilmar convivia muito com seus alunos que também eram seus amigos. "Uma relação que estabelecemos muito  nossa, estamos presente na vida um do outro”, comenta Magela Lima, coordenador na UNI7 e ex-aluno. O professor formava laços e prolongava suas amizades, junto com seus alunos. “Quando nos conhecemos ele perguntou: Você também é Geraldo? Eu disse: sou! E daquele dia em diante a gente nunca mais se soltou”, descreve o ex-aluno.

 

O pesquisador, professor, jornalista, escritor e curador é lembrado como um “grande amigo”, “foi um grande privilégio ter vivido com o professor Gilmar de Carvalho’’, confessa a empresária e amiga de Gilmar, Rosana Lins. Ao descansar nas raízes do baobá, no Passeio Público, Rosana comenta que ainda se sente próxima dele e que trabalha em frente ao local. “Foram seis anos de amizade”, a empresária sente falta das conversas, do bom senso de humor do pesquisador, “uma pessoa completa, muito inteligente”, lamenta pela morte de Gilmar que soma a milhares de pessoas que foram levadas pela Covid-19.

 

"Generosidade" é um dos substantivos mais associados à personalidade de Gilmar. “Ele nos apresentava a cultura popular”, comentou o ex-aluno da turma de 2000 e amigo, Lizaldo Maia. Entre viagens e visitas, o professor procurava repassar e apresentar novos olhares sobre a cultura popular, falar de seus estudos e como os saberes e artes tradicionais são importantes para os cearenses. Lizaldo conta que Gilmar nas horas vagas procurava ler e estudar e se possível viajar, “viajou por todas as cidades do Ceará”, relata o amigo.

 

O famoso “Gildecar”, era conhecido assim por alguns alunos, devido ao um e-mail que era utilizado quando lecionava da UFC. Incentivou muitos e muitas a produzir academicamente”, relata o jornalista e ex-aluno da turma de 2004 da UFC, Daniel Fonseca. O professor queria conhecer a cultura da região do Cariri e conseguiu na década de 70. Daniel conta que as falas de Gilmar eram simples,  sem ser simplista, mas certeiro com suas falas,  ele conseguia repassar as informações para quem as contava.

 

A antiga Praça dos Mártires, popularmente conhecida como Passeio Público, foi palco para muitas conversas e reuniões, sentado no banco, as palavras e o silêncio eram parte da sua rotina e das pessoas que o cercavam. Hoje, nas raízes do antigo baobá, parte das cinzas de Gilmar nutrem os saberes do amanhã, como memória e esperança. Assim os pilares que definem quem foi Gilmar de Carvalho, foram a ética, o afeto e a sabedoria que tecem uma parte da essência do ser que buscou ensinar e aprender.

 

Gilmar nasceu em 30 de agosto de 1949, em Sobral, com quase dois anos, foi morar na capital cearense. Graduou-se em Direito (1971) e em Comunicação Social (1972) pela Universidade Federal do Ceará (UFC), foi mestre em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (1991) e doutor em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1998). Aposentou-se como professor do Departamento de Comunicação Social da UFC, onde lecionou entre os anos de 1984 a 2010. Devido a pandemia do coronavírus em que enfrentamos, Gilmar faleceu aos 71 anos, em 17 de abril de 2021, em Fortaleza, vítima de complicações da Covid-19.

 

Contribuiu muito para o mundo: escreveu diferentes tipos de textos, passando pela poesia, romance, teatro, notícia, crônica, crítica, propaganda, ensaio, até textos acadêmicos como a tese. Gilmar fez história, aprendeu muito e ensinou mais ainda. Publicou mais de 50 livros, a maioria deles acadêmicos. Em 2021, o livro Poéticas da Voz – Aboios, Benditos, Cantoria, Cordel, Emboladas, Loas, Saraus, Torém, Trovas seria lançado, não chegou a ser publicado. A obra retrata o cordel e os cordelistas cearenses desde o século XIX. Além desse título, cerca de mais quatro obras estavam em fase de produção.

 

Gilmar foi uma personalidade que cativou, ensinou e conquistou com seus saberes e sua vontade incansável. Ajudou muitos, com conselhos, e boas histórias, disseminando sempre a boa cultura popular cearense e suas várias facetas. Simples, mas vaidoso, um sábio, um forte. Assim como o baobá se fixa e perdura, as palavras e ensinamentos de Gilmar se enraízam e fazem morada em nossos discursos, estudos e em nossas vidas. A família, amigos e ex-alunos, nossos sentimentos. 

 

“Ele tinha um olho diferente, um olho acadêmico, um olho de admiração cultural. O olho de Gilmar era de uma sensibilidade muito grande”, Daniel Assaré, neto do Patativa do Assaré, poeta e amigo

 

“Ele confiava muito em mim e eu confiava muito nele”,

Magela Lima, coordenador na UNI7 e ex-aluno da turma de 2004 e amigo

 

“Minha eterna paixão e gratidão pelo professor, Gilmar de Carvalho”, Rosana Lins, empresária e amiga

 

“Uma verdadeira enciclopédia da cultura popular”, 

Lizaldo Maia, ex-aluno da turma de 2000 e amigo

 

“Gilmar era essa figura que tinha uma ironia cortante, um comentador da vida social, uma ironia refinada e rebuscada", 

Daniel Fonseca, jornalista e amigo

 

“Sempre foi um professor bastante inquieto, uma pessoa com o horizonte bastante amplo”, 

Ricardo Jorge, professor do curso de jornalismo da UFC, ex-aluno entre os anos de 1987 e 1988 e ex-colega de trabalho

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